Festa de aniversário para o pet, testamento deixando todos os bens para o animal de estimação, hotéis e clínicas de estética para cães e gatos. É cada vez mais comum vermos pets sendo tratados como seres humanos. Ou mais, como membros da família. Com tanta troca de carinhos e afetos, muitas pessoas costumam beijar animais na boca e permitir que eles retribuam com suas afetuosas lambidas, desconhecendo os riscos que isso pode trazer para a saúde de ambos.

“Com certeza, as relações estabelecidas de tutores com os seus pets de estimação, demonstrada por hábitos de carinho e seu estilo de vida, podem favorecer a transmissão de doenças zoonóticas parasitárias”, adverte o veterinário parceiro da clínica Soft Dogs e Cats, Igor Marques Alvarez. “Especialmente pelos hábitos de dormir com o cão ou ser lambido pelo mesmo na boca.”

Caroline Mouco Moretti compartilha da mesma profissão e opinião que Alvarez. Fundadora do grupo Vet Popular, a veterinária explica que beijar animais na boca, no focinho ou no pelo, pode nos colocar em contato com agentes que trazem doenças consideráveis ao ser humano.


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“Hoje, com o estreitamento dos laços dos pets com seus tutores, mudou-se também a relação com ele, assim como a demonstração de carinho”, conta. Vindo de um histórico onde os animais domésticos apenas moravam no quintal e serviam como guardadores e protetores das residências, Caroline observa que há tempos essa realidade mudou, e hoje cães e gatos habitam o interior de nossas casas, frequentam nossos sofás e dormem em nossas camas.

“Por mais que o pet seja bem cuidado com, por exemplo, escovação dentaria após refeições, ausência de placas bactérias ou cálculos dentários, vermifugações e vacinações em dia, alimentação da melhor qualidade, apesar de todos esses cuidados, esses agentes causam malefícios à saúde de outra espécie como os humanos”, explica Caroline.

O que a ciência diz sobre beijar animais na boca?

Alvarez cita um estudo da pesquisadora e doutora em Epidemiologia Experimental Aplicada a Zoonoses pela USP (Universidade de São Paulo), Maria Anete Lallo, publicado em 2016 com o título "Comportamento humano na criação de cães e a prevalência de parasitos intestinais com potencial zoonótico" em que, de acordo com o especialista, esses riscos são bastante evidenciados.

“Foram analisadas amostras fecais de mil cães, sendo 500 domiciliados, 250 de abrigos e 250 de canis comerciais, e o resultado dos estudos foi impressionante. Cerca de 37% dos animais domiciliados apresentaram uma carga parasitária intestinal de grande importância para a saúde pública”, alerta Alvarez. Outro ponto de destaque levantado pelo estudo foi a alta prevalência desses parasitas em cães que vivem em coletividade, reforçado pelo risco maior de parasitose intestinal em cães que conviviam com outros cães em domicílios.

No ano passado, o periódico britânico Daily Mail publicou a história de pessoas que sofreram uma série de infecções após beijarem seus animais de estimação na boca, direta ou indiretamente. Em um dos casos, uma mulher foi hospitalizada com problemas respiratórios por ter lambido um conta-gotas sujo com mel. O problema é que o mesmo conta-gotas era usado diariamente para alimentar seu gato. Outras duas mulheres foram internadas após beijaram seus animais alguns dias antes deles morrerem. Todas as três mulheres foram infectadas com uma bactéria encontrada na boca dos animais.

beijar animais na boca

Crédito: rnbacardi / shutterstock

Esses dois últimos casos receberam maior atenção, com direito a estudo publicado na revista Clinical Infectious Diseases (Clínica de Doenças Infecciosas, em livre tradução) e que mostra o perigo de dar carinho aos animais em seus últimos dias de vida. As infecções diagnosticadas nas duas mulheres foram causadas pela bactéria Pasteurella multocida, encontrada em 80% dos gatos e 60% dos cães. A transmissão acontece por meio de mordidas, arranhões e até mesmo de lambidas. O problema pode ser ainda maior em crianças e pessoas idosas, por terem um sistema imunológico mais fraco e maior possibilidade de contrair infecções.

As três mulheres, que antes gozavam de plena saúde, foram internadas com sintomas como calafrios, febre, dor de garganta e dificuldade para respirar e engolir alimentos. Tratadas com antibióticos, todas se recuperaram em poucos dias.

Outro estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Osaka, no Japão, identificou que pessoas que se permitem beijar e ser beijadas por seus pets têm maior propensão a ficar doentes. O motivo? São contaminadas por vírus pertencentes à flora desses animais. E o pior: também transmitem para os animais vírus presentes na flora humana.

Principais doenças transmitidas pela saliva dos pets

De acordo com a médica veterinária Caroline Moretti, alguns dos problemas mais comuns são infecções respiratórias e intestinais, gastroenterites e colescistite. “A boca dos pets está cheia de agentes patogênicos facilmente transmitidos pela saliva”, destaca. “Em cães, por exemplo, os gêneros mais comuns são os Clostridium, Escherichia coli, Salmonella e Campylobacter, que são bactérias relacionadas diretamente a sintomas como diarreia, vômito, desidratação, mal estar, dor no corpo, febre e falta de apetite”.

Entre as doenças de alto potencial zoonótico, Alvarez acrescenta os protozoários Giardia sp. e Cryptosporidium sp., patógenos que oferecem grande risco à saúde pública, uma vez que podem ser transmitidos pela água e pelo contato direto com animais infectados. “Também temos alguns helmintos que podem transmitir doenças para os seres humanos, porém precisam de condições ambientais favoráveis para sua infecção, consequentemente seu contato direto é de menor importância.”

Caroline explica ainda que essas bactérias não causam qualquer problema para cães sadios. Já quando em contato com a mucosa imunologicamente comprometida de seres humanos, podem causar grandes malefícios. Ela alerta também para o contato com fungos que podem estar presentes no pelo do animal e vermes transmitidos pela saliva, desde que o animal tenha tido contato com as fezes.

Até onde podem ir as trocas de carinho?

“A relação dos pets com seus humanos nunca estivera tão estrita como nesses últimos anos, porém indicamos alguns cuidados na hora do carinho como, sempre que possível, higienizar as mãos antes e após contato com os animais para se evitar ao máximo risco de transmissão de doenças, tanto deles para nós, quanto de nós para eles, e evitar contato de lambeduras na região do rosto”, enfatiza Alvarez. E garante: “Tomando esses cuidados, o carinho sempre será muito bem-vindo para nossos pets”.

Para Caroline, é importante restringir o contato da saliva do animal com nossas mucosas, e isso inclui evitar beijar a boca dos animais. Já abraços, carinhos, brincadeiras e afagos estão liberados.

“Sabemos que estes pets nos oferecem só o que há de melhor, são atenciosos, amáveis, companheiros. Além disso, já está comprovado que eles oferecem um suporte psicológico ao ser humano de grande importância e por tudo isso sentimos a necessidade de recompensar todo esse afeto. Porém, precisamos preservar nossa saúde”, afirma.

Prevenção e cuidados

Para evitar todas essas doenças, a recomendação de Caroline é que os pets estejam sempre em dia com vacinação, vermifugação, remédios antipulgas, checkups dentários, banhos e visitas ao médico veterinário.

“Evitar o contato da saliva dos pets com a mucosa humana ou feridas abertas também é de suma importância. A lavagem das mãos recorrentes também é muito importante”, alerta.

Alvarez também lista uma série de cuidados importantes, como a realização de exames complementares tais como exames de fezes para verificar a carga parasitária e a administração correta dos fármacos antiparasitários internos, adquiridos em locais seguros e que tenham um profissional da saúde preventiva para auxiliar na administração e na quantidade corretas dos mesmos.

“Não beijar a boca dos animais e evitar lambidas na região da face; realizar limpeza constante nas dependências da residência, em especial onde os pets tenham acesso e transitam; uso correto da quantidade dos produtos de limpeza e sempre manter os cuidados necessários no ambiente em que o animal está localizado, com a ajuda de um profissional qualificado do setor de saúde preventiva para evitar a proliferação dos parasitas”, enumera o veterinário.

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