Eles têm oito filhos, seis netos e um bisneto. Rômulo de Jesus Dieguez de Freitas, 65 anos, advogado, brinca que sua mulher, a turismóloga Ivane Fávero, 47 anos, dorme com um bisavô. Em Garibaldi (RS), levam uma vida profissional intensa. Mas neste ano tiraram o pé do acelerador e se permitiram passar dois meses na Europa.

Os 60 dias de viagem foram meticulosamente planejados com meses de antecedência, mas não impediram que descobrissem, já com o trem deixando Milão, que embarcaram com um dia de antecedência, nem que chegaram ao tradicional jantar no cabaré Moulin Rouge, em Paris, com um dia de atraso.

Sair da zona de conforto e aventurar-se criando seu próprio roteiro é o que o casal propõe no blog Viajante Maduro (http://viajantemaduro.com.br/), no qual compartilharam experiências como essa. Nas viagens, Rômulo diz que descobriu lugares espetaculares. “Minha vida era só trabalho, trabalho, trabalho, trabalho, trabalho e... trabalho”, comenta. Leia os principais trechos da entrevista exclusiva ao Instituto de Longevidade Mongeral Aegon.

 

Como nasceu o blog Viajante Maduro? A ideia é exercitar o ócio?

Ivane - Sim, mas estamos ainda em busca de mais ócio. Deixei para trás 30 anos de carteira assinada e iniciei carreira de consultora de turismo, em janeiro deste ano. Foi quando tive a ideia, também, de fazer o blog, e convidei o Rômulo para estar comigo nessa viagem. A ideia é ter uma memória das nossas experiências e, principalmente, compartilhar esse nosso aprendizado de vida.

 

O que é ser um “viajante maduro”?

Ivane – Não é o velho! É alguém que já fez viagens pelo mundo, que sai da zona de conforto de ter tudo programado por uma agência e que se arrisca a montar o seu roteiro, para que possa ter respeitados o seu tempo, a sua velocidade e as suas definições.

“O viajante maduro é aquele que permeia o lugar quase que sem ser percebido, mas que tem um interesse grande em desvendar culturas”

Como vocês montam os roteiros? Trocam ideias com outros blogueiros, pesquisam nos sites oficiais, checam avaliações em sites de reservas, assistem a programas sobre o lugar?

Ivane – Tudo isso e mais a relação com amigos pelo mundo, em função do meu trabalho e do enoturismo [ela é presidente da Associação Internacional de Enoturismo]. Mas, claro, como todo viajante maduro, o que se pesquisa: blogs e sites, Facebook, Instagram, principalmente os comentários.

A gente procura fugir do roteiros-padrão, até porque existe todo esse movimento do anti-turismo, aquele que impacta negativamente a região. E respeita os moradores do local visitado, que permeia o lugar quase que sem ser percebido, mas que tem um interesse muito grande em desvendar culturas.

Rômulo – E tem de ficar perplexo com o mundo, dizer, bah, espetacular, fantástico.

Ivane – E o que a gente mais gosta de ver é cada vez mais idosos viajando e pessoas às vezes com bengala, mas sozinhas, com autonomia.

“Não precisamos mais andar com a massa, queremos customizar o nosso roteiro, no nosso tempo”

Vocês nunca viajam em excursões nem contratam guias especializados?

Ivane – Condutor local, para visitar um museu, um sítio arqueológico, um patrimônio histórico, sim, mas no local. Nós não precisamos mais andar com a massa, queremos customizar o nosso roteiro, no nosso tempo.

 

Qual foi a melhor experiência que vocês dois já viveram viajando?

Rômulo – Vou falar da última, Bolonha, Osteria del Sole, um butecão. Na porta, havia uma placa: “Não servimos comida, aqui só se bebe vinho ou espumante”. Era uma mesa comunitária, e as pessoas beliscavam dos seus pacotinhos pardos, com queijos e embutidos. A Ivane saiu para comprar, e eu comecei a conversar com universitários. Eles falando italiano; eu, portunhol. Quando ela chegou, estávamos às gargalhadas, celebrando. Sou fissurado em obras de arte, e vi muitas na Itália, mas o que me marcou foi o relacionamento humano, com o grupo, com os cidadãos locais.

Ivane – E essa interação só é possível em viagens de pequeno grupo. Nós não somos só observadores, somos vivenciadores. Hoje temos muitos amigos feitos nessas viagens.

Então vocês devem também repudiar pacotes com pensão completa.

Ivane – Total, nada a ver. Ele te trancafia dentro de um espaço e te tira a possibilidade de uma descoberta gastronômica.

“Sabemos da nossa condição, temos consciência disso. Mas isso não impede de a gente fazer o que a gente gosta e deixar de fazer o que não gosta”

Nessa faixa etária, as pessoas, quando viajam, se preocupam muito com seguro-saúde. Mas o fato é que, nas viagens, as dores diminuem, não?

Rômulo – Com certeza!

Ivane – Claro que é importante, porque o custo-benefício vale a pena. Mas o fato é que viajar espanta todas as dores e todos os males.

 

A idade já os impediu de fazer algum passeio?

Ivane – A gente tem uma vida ativa, caminha todos os dias. Isso é importante, manter o corpo saudável. E procuramos locais para uma nossa idade: por exemplo, não vamos a uma balada, mas simplesmente porque a gente não gosta.

Rômulo – Não queremos ser jovens. Sabemos da nossa condição, temos consciência disso. Mas isso não impede de a gente fazer o que a gente gosta e deixar de fazer o que não gosta. E, se tiver que subir uma escadaria para chegar a um lugar, como em Machu Picchu, a gente vai. Vai se borrando, mas vai!

“É possível planejar viagens economizando um pouco por mês”

Que conselhos vocês dão para quem quer começar a viajar?

Ivane – Primeiro, estruturar a sua vida e torná-la mais leve, aqui. Alguém que tem muito peso não vai conseguir se desvencilhar para aproveitar a viagem. É aquela pessoa que viaja estressada, preocupada, que não desliga, que fica ligando toda hora para saber como estão as coisas. Como? Minimalismo: diminuir estruturas, patrimônio.

Se tem filhos dependentes, deixa bem encaminhado com quem vão ficar. O mesmo para os animais de estimação. E, financeiramente, também te estrutura: é possível planejar viagens economizando um pouco por mês.

Bom, com vida estruturada e dinheiro, pesquise com, no mínimo três meses de antecedência, passagens e hotéis. E faça reservas de espetáculos e restaurantes. Porque daí não precisará se estressar e perder tempo com isso. Não tenha medo de comprar e fazer reservas em sites oficiais: dá control C, coloca no tradutor.

Outra coisa: não fique só nos hotéis de grandes redes. Aventure-se em pousadas e no Airbnb (https://www.airbnb.com.br/), que dá a possibilidade de um convívio com a comunidade e também de economizar com refeições, que em geral elevam muito o custo de uma viagem.

“Tenha coragem de sair da zona de conforto e confie no mundo”

Rômulo – Você sempre vai encontrar gente boa para te ajudar. Tenha coragem de sair da zona de conforto e confie no mundo.

Ivane – O anjo-da-guarda dos viajantes maduros sempre os acompanha.

 

Qual foi a situação mais inusitada que vocês já viveram?

Ivane – Descobrir que uma cidade como Bordeaux não tem rodoviária, por exemplo. A gente ia da França para a Espanha, compramos a passagem pela internet e não sabíamos onde pegar o ônibus. Ninguém sabia informar. Até que encontramos um francês que trabalhava na estação ferroviária, que era filhos de portugueses, e que nos informou que ele parava num determinado ponto em uma avenida.  Mas tem outras, e muitas, que fazem parte dos folclores das nossas viagens.

Ivane – Mas esse é o espírito. Se der errado, aproveita e colocar no caderninho folclore da viagem.

Ah, mas tem a do trem, que é muito pior.

O que aconteceu?

Ivane – Montei dois meses de roteiro pela Europa redondinho, menos um dia. Acho que eu ficava até de madrugada e, cansada, anotei errado o dia do trem. Embarcamos em Milão, primeira classe, um dia antes. Já no meio do caminho, chega o bilheteiro, pede as passagens e, constrangido, nos explica: “a passagem de vocês é para amanhã”. E eu pensei: “meu Deus, vão nos desembarcar no meio dessa neve...”.

Mas, muito gentilmente, ele nos transferiu para o último vagão, praticamente na máquina. Eram só quatro lugares, onde dois estava ocupados por dois egípcios. E daqui a pouco chega a polícia, armada, na fronteira, e começa a questioná-los. E desembarca um deles. E a gente só se olhando e pensando: será que era um terrorista?

Mas tudo isso por quê? Porque a gente estava com o espírito de “o que vier, vem bem”. Essas histórias só vêm para apimentar a viagem.

 

Já sentiram medo em viagem?

Rômulo – No trem.

 

Já contabilizaram o número de cidades e/ou países que conhecem?

Rômulo – Não, preferimos contar as que faltam.

 

E qual é a viagem dos sonhos?

Ivane e Rômulo – A próxima!

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