Preste muita atenção, porque eu só vou ensinar uma vez: duas xícaras de farinha de trigo, seis ovos, leite, uma pitada de sal e outra de açúcar. Acrescente fermento e bata muito bem, até a mistura soltar da mão. Não se esqueça de colocar um punhado de canela.

Quem nunca seguiu a receita da avó, da mãe, da tia solteirona e acabou pagando mico? Fala sério! Ninguém dá a receita certa, tem sempre uma pegadinha, um truque não revelado, razão pela qual o bolo, na maioria dos casos, acaba solando. Aí, fica difícil de comer. Com um pouco de boa vontade, dá para engolir, mas revirar os olhos e estalar a língua de prazer, isso nunca!

O raciocínio se aplica, perfeitamente, aos livros de autoajuda. Tem sempre um sujeito pronto a compartilhar a fórmula de sucesso nos negócios, no casamento, no dia a dia. Antes de se decidir, antes de dar o próximo passo, pense nos ensinamentos de ‘Shananda Caramba’, mestre na quântica geral do universo estável, algo assim como porra nenhuma. E o pior é que esses caras, aproveitadores do estado de carência da humanidade, vendem milhões de livros e ficam ricos, enquanto nós – os agentes do mundo real -, aprendizes do cotidiano, contamos erros e acertos como as moedinhas do cofre da vaquinha de barro, que custa dez pratas no camelô da esquina.

Quando eu me casei em 1976, pensava que era o protagonista da novela das oito, fadado a um caso de paixão eterna. Depois de cinco anos de namoro e noivado, partimos para o altar. Eu deveria ter desconfiado quando a vi entrar na igreja coberta da cabeça aos pés por um manto cinza-chumbo, em perfeita sintonia com os governos militares de então. A união não durou três anos.

No fim de 1980, conheci minha segunda mulher, atual e definitiva companheira de trinta e oito anos de estrada. Se não me falha a memória, foi em novembro, durante o julgamento de Doca Street, autor de um crime passional que inflamou a opinião pública de norte a sul do país. Em março de 1981, estávamos casados e sacramentados por uma mãe de santo em fim de carreira.

Daí em diante, vivemos momentos de felicidade extrema e outros períodos de desesperança, como qualquer casal. Por vezes, nos odiamos com todas as forças, mas quase sempre nos amamos com um amor acima dos mortais.  Criamos um filho que recebi no rascunho de quatro anos e que, hoje, aos quarenta e dois, é um médico bem-sucedido, chefe de outra tribo linda, com dois netos que me fazem acreditar no futuro.

Com tudo o que experimentei e aprendi nos meus sessenta e nove anos, acho – não tenho certeza – que ninguém tem a receita exata do bolo, a fórmula irretocável para nada na vida. E se alguém tiver, jamais ensinará o pulo do gato. Disso tenho absoluta certeza. É preciso que cada um de nós experimente e cresça com as tentativas. É bom, também, ouvir os mais velhos, pois são os senhores da ponderação e da paciência, algo que escasseia na juventude.

Todavia, no final das contas, quase tudo nessa jornada é um jogo, onde podemos nos dar bem ou afundar como o Titanic. A sorte é, e sempre será, a nossa mais fiel parceira. Até o fim.

Parafraseando Heráclito, o filósofo grego, você nunca conseguirá banhar-se duas vezes no mesmo rio. Ou como escreveu Nelson Mota, “nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia”. Nossas experiências são únicas, assim como as nossas impressões digitais. Think about it.

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