Os sintomas são visíveis: a pessoa não tem ânimo para muita coisa e, geralmente, se entrega ao comodismo de atividades cotidianas que não passam muito longe do estiramento no sofá diante da TV ligada. Mais difícil que identificar a manifestação do quadro, contudo, é determinar o que está por trás desse comportamento. 

A falta de vontade de buscar coisas novas, e aqui falamos mesmo de um programa de lazer diferente, um passeio ou uma viagem, é um mal que acomete em especial os homens aposentados, na avaliação de Valmari Cristina Aranha, psicóloga do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e presidente do departamento de gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia em São Paulo. 

“Quando os homens param de trabalhar, não sabem mais o que fazer.” 

“É um problema muito ligado ao envelhecimento masculino”, afirma Valmari. “Quando os homens param de trabalhar, não sabem mais o que fazer. Não foram preparados para isso”, analisa. Segundo ela, muitos se acomodam dentro de casa e “viram meio que filhos das suas mulheres”.  

A psicóloga destaca que o trabalho exerce um papel social importante na vida. “É onde eles fazem amigos e encontram motivação. Quando param de exercê-lo, acabam voltando para um ambiente que não é o seu: o da casa, que ainda é um lugar que pertence muito mais às mulheres, embora isso venha mudando um pouco.” 

E, por sinal, a maior familiaridade delas com questões relacionadas ao mundo fora do escritório explica por que, em geral, continuam mais ligadas nos anos de aposentadoria – frisando que não se pode generalizar essa afirmativa.  

Não é que sigam “apenas” cuidando dos netos ou de assuntos ligados à gestão doméstica. A psicóloga do HC lembra que mesmo as opções que a comunidade oferece para a socialização e o entretenimento de pessoas mais velhas se voltam principalmente para as mulheres, como grupos de oração ou tricô. “Mas já tem aumentado o número de alternativas para os homens, que preferem atividades mais competitivas, como as esportivas.” Essas válvulas de escape são importantes para oxigenar a vida deles como um todo. 

“O homem precisa reconhecer que sua inclusão em grupos nessas instituições não afeta em nada a sua masculinidade.” 

Para Diego Miguel, gestor do centro de convivência do CRI Norte (Centro de Referência do Idoso da Zona Norte) da cidade de São Paulo, os serviços públicos devem se atentar para a falta de opções de lazer para o público masculino de idade mais avançada. “Há também uma percepção cultural que tem de ser desconstruída”, afirma. “Ao procurar um centro de convivência, ele se abre para o cuidado, e, mesmo por questões de machismo e patriarcado, não tem a predisposição para essa abertura – quer é exercer o papel de cuidador. O homem precisa reconhecer que sua inclusão em grupos nessas instituições não afeta em nada a sua masculinidade.” 

Com o intuito de romper barreiras, o CRI Norte criou uma oficina chamada Confraria Masculina. “A ideia não é promover uma separação de gênero”, diz Miguel. “Queremos desmistificar a participação dos homens em grupos de convivência. Na confraria, eles se encontram para discutir temas pelos quais em geral se interessam mais, como sexualidade, esportes, política e economia. Mas são também incentivados a participar de outras oficinas em que predomine o número de mulheres. Já houve quem passou a fazer a de bijuteria, por exemplo.” 

O CRI Norte oferece atualmente mais de 100 oficinas de temas variados, como música, corte e costura e esportes. Duas delas são voltadas especificamente para os homens – além da confraria, há um grupo de artesanato masculino.  

“O papel econômico que o homem exerce se reflete em sua capacidade de potência no sexo.” 

O abatimento pós vida produtiva pode se espraiar até para a sexual, segundo Valmari. “O papel econômico que o homem exerce se reflete em sua capacidade de potência no sexo”, diz. “E um problema de ereção também irá reduzir o carinho que ele dedica à sua mulher, ou fazer com que evite até mesmo o beijo na boca, uma vez que não se sentirá capaz de atingir o ápice da relação física.” 

Existem, no entanto, variações comportamentais sobre o tema. Há aqueles maridos que tentarão retomar o “tempo perdido” na vida sexual, com a própria mulher ou mesmo fora do casamento. 

Quando o homem tenta essa retomada no casamento, pode causar conflitos que vão além das relações físicas. “A mulher pode não querer reiniciar de súbito uma história que não foi contínua e eventualmente tenha sido pontuada por mágoas”, afirma Valmari. 

Há muitos aspectos importantes que se escondem nos bastidores da clássica cena do marido largado no sofá em frente da televisão. Buscar entender os caminhos que levam a ela é a forma mais indicada de lidar com o problema, tanto para o próprio homem como para quem vive com ele. A ajuda de um especialista, como um terapeuta, pode facilitar esse processo. 

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