Quem perguntar à brasileira Janice Vieira, 66 anos, se ela se considera uma boa motorista, receberá uma resposta firme. “Sim. Sempre fui. Dirijo desde 1976. São 41 anos.”  

Para além do clichê que faz todo mundo se sentir um ás do volante, o histórico corrobora com a afirmação da securitária. “Nesse tempo todo, recebi apenas três multas. Foram 35 anos sem nenhuma notificação”, afirma. Um recorde que tem tudo para ganhar números ainda mais vultosos. Afinal, segundo ela, a experiência só fez crescer a confiança e, principalmente, a cautela e o respeito com os demais condutores. 

“Os mais velhos são, em geral, melhores motoristas. A experiência lhes mostrou que existem muitos riscos e perigos no trânsito e que uma atitude mais prudente traz resultado melhores”, explica Luiz Henrique Fonseca, especialista em trânsito e direção defensiva. 

A opinião é compartilhada pelo corretor de seguros Bruno Rocco. Há muitos anos no mercado, ele acredita que a idade joga a favor de seus clientes. “Para pessoas entre 55 e 80 anos, o seguro tende a ser bem mais barato. Porque a seguradora entende que elas são mais cautelosas. Não oferecem tanto risco quanto um jovem de 18 anos, por exemplo, que costuma fazer manobras mais arriscadas”, diz. 

Segundo estudo divulgado pelo Grupo Segurador Banco do Brasil e Mapfre com base nos atendimentos realizados entre julho de 2016 e junho de 2017, das 17,9 mil colisões ocorridas na cidade de São Paulo, a menor taxa de incidentes se concentra nas pessoas com mais de 57 anos: são 10,23% entre 57 e 67 e 3,62% acima dos 68. 

Trata-se de um número expressivo, se considerarmos que dos mais de 6 milhões de habilitados da capital paulista, 17,2% se concentram nessa faixa etária, segundo dados do Detran-SP. Entre os segurados de 27 e 36 anos, a taxa de incidentes é de 30,06%. Na sequência estão os condutores de 37 a 46 anos, com 25,36%, e de 47 a 56 anos, com 16,10%. Quem tem até 26 anos soma 14,64% dos registros. 

“O idoso provoca menos acidentes desde que esteja devidamente dentro do padrão de saúde regulamentado.” 

Mesmo assim, Alberto Sabbag, especialista em medicina do tráfego, faz ressalvas à generalização. “O idoso provoca menos acidentes desde que esteja devidamente dentro do padrão de saúde regulamentado.” 

A preocupação tem sentido. Muito além da experiência, a direção exige uma combinação de capacidades motoras, como a força para segurar o volante e pisar no freio; sensório-perceptivas, que garantem os estímulos visuais e auditivos; e cognitivas, que permitem que tais estímulos sejam processados e que o motorista responda a eles da maneira correta. Infelizmente, a maturidade faz todas elas caminharem na contramão da prudência. 

“A idade afeta as habilidades físicas e mentais pelo uso de medicamentos, pela desatenção, pela morosidade do pensamento e pela lentidão dos movimentos. Além de cataratas e outras doenças oculares, há perda auditiva e dificuldade de se adaptar a mudanças ambientais bruscas”, complementa Sabbag. 

Para garantir que estas dificuldades não incapacitem os motoristas, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) estipulou regras. Após os 65 anos, o prazo de validade da CNH cai de cinco para três anos, podendo ser ainda reduzido de acordo com o estado de saúde.  

Somado a isso, durante a renovação da licença, os condutores passam a ser submetidos a uma avaliação mental específica, além do exame físico. Dependendo do resultado, eles podem ser proibidos de guiar após o pôr do sol ou em vias de trânsito rápido, por exemplo. 

Entretanto, mais uma vez, é preciso cuidado com as generalizações. Como o corpo de cada pessoa responde de modos diferentes ao envelhecimento, é impossível estabelecer um limite fixo de idade. “Depende da saúde de cada condutor. Há alguns que aos sessenta anos estão piores que outros aos oitenta”, pondera o médico. 

O médico veterinário Fernando César Patitucci,73 anos, brinca: “Aos 80, é melhor nem dirigir mais. É melhor ficar em casa sossegado”. Mas acrescenta que a maturidade exerce um papel fundamental na segurança e no modo de pilotar, graças às experiências do passado. “Aos 20 anos, o mundo é meu. Aos 50, sei que tenho que dividir o mundo com os outros e que é preciso colaborar com as pessoas para que a vida flua melhor.” 

Janice, a motorista nota 10 cuja história abriu essa reportagem, não pensa em parar. “Vou continuar até quando puder”, afirma. E se mantiver o ritmo, vai seguir colecionando muitos quilômetros de experiência... e poucos pontos na carteira.

Confira abaixo se você é bom motorista 

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