Identifique o erro em relação ao tratamento dado a pessoas com perda de audição nas duas situações (verídicas) abaixo.

Caso 1: a filha diz para o pai de 75 anos que ele está ficando surdo – e que surdez é uma das causas preveníveis de demência.

Caso 2: o filho diz à mãe de 71 anos que o volume da televisão está infernal – e que se não procurar um médico, ele não voltará mais para visitá-la.

Na primeira, apesar de haver uma comprovada ligação entre perda de audição e demência, a filha poderia ter abordado o tema com mais delicadeza e empatia. Na segunda, o jovem poderia ter oferecido auxílio em vez de usar de chantagem.

Esses são apenas dois exemplos de um problema que ocorre com frequência todos os dias. Filhos tentam alertar pais sobre a necessidade de procurar a avaliação de um otorrinolaringologista. Mas, muitas vezes, recorrem a estratégias questionáveis na abordagem – mesmo com a melhor das intenções.

A preocupação dos filhos se justifica. A redução da capacidade auditiva pode provocar perda de autonomia, depressão e isolamento social. Por isso, especialistas recomendam que, ao sinal de dificuldade em acompanhar conversas e ouvir a distância, aumento do volume da TV e do rádio, dificuldade na localização da fonte sonora ou presença constante de zumbido, o melhor é agendar uma consulta.

“A partir dos 45 anos, eu já recomendaria que a avaliação auditiva fizesse parte do check-up anual de todos os indivíduos”, sinaliza a fonoaudióloga especialista em audiologia Isabela Papera, da Telex Soluções Auditivas.


Segundo ela, existe um estigma que ronda esse tema. “As pessoas relacionam a perda auditiva ao envelhecimento, acham que os aparelhos ‘não têm tecnologia’ e são ‘coisa do passado’.” Mas existem formar de reduzir esse problema.

Conheça, a seguir, como abordar o assunto com pais e parentes.

Converse com empatia

Use de delicadeza, sem perder a franqueza, recomenda Lia Padovan, psicóloga e psicoterapeuta especializada em adultos, casal e família. “Você não acha que podemos dar uma passada no otorrino?” pode ser uma forma de começar.

Foque o positivo

Falar dos problemas da redução da audição, como perder a independência, comprometer laços pessoais e ter impacto na capacidade cognitiva, é uma das maneiras de abordar o assunto. Mas tratar de uma forma positiva, reforçando que o dia a dia com os netos ficará melhor e que as conversas telefônicas serão mais fáceis, pode ter outros desdobramentos – bem mais simples do que enfocando o lado negativo da história.

Tenha abertura para escutar

“Quem sabe tudo não para para ouvir o outro”, destaca Lia. Pergunte como a pessoa se sente e entenda quais são as dúvidas. Ou seja, tenha disposição para dialogar, e não somente para falar.

Ofereça ajuda

Pode ser na marcação da consulta, na escolha do especialista, na ida ao médico. Ter disponibilidade pode ajudar a derrubar algumas barreiras e receios. Mas use também a assertividade. “Deixa marcar para você?” pode funcionar melhor do que “Quer que eu marque?”.

Sugira um teste

De antemão, sem consultar um médico, é impossível saber qual será o tratamento recomendado. Pode ser cirúrgico ou medicamentoso, envolver o uso de aparelho ou a realização de implante coclear. Por isso, vale sugerir uma ida ao médico como teste – a solução pode ser mais simples do que se espera.

Planejem juntos

“Não é decidir por ele, mas decidir com ele”, diz Lia sobre o papel do filho no auxílio ao pai que está perdendo a audição. Incentivar a autonomia, respeitando as limitações, é sinal de respeito.

Aceite

Seja lá qual for a decisão de um dos pais na busca por tratamento para a perda de audição, aceite. Não se coloque de maneira impositiva e evite a agressividade. “Algumas pessoas são resistentes e é preciso aceitar isso”, diz Lia.

Pesquisar vale a pena?

Recolher dados sobre perda de audição, aparelhos auditivos e audiometria, entre outros tópicos, pode ser uma faca de dois gumes, segundo a psicóloga. Ela explica que o primeiro empecilho começa na escolha das fontes, já que a internet é um terreno fértil, mas com muitas informações equivocadas. O segundo está em chegar pelo Dr. Google (forma pejorativa como o mecanismo de busca é usado para o “diagnóstico” de doenças por leigos) dados que possam mais atemorizar do que esclarecer.

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