“Na minha época era diferente.” Era mesmo, especialmente quando se fala de netos. A relação com os avós parecia mais próxima. As conversas com os pequenos sobre a história da família tinham frequência maior. Os almoços em família eram sagrados – desmarcá-los, só em última instância.

Pode ser chavão, mas os tempos mudaram mesmo. Essa união está hoje permeada por novas rotinas, tecnologias e hábitos – e muitos avós se sentem inseguros quanto ao seu papel. Devo palpitar na educação do neto? Repreendo a criança ou o adolescente sobre o uso excessivo do celular? Como conto sobre as ricas tradições que passaram de geração para geração?

Essas perguntas, entre tantas outras, são debatidas na Escola de Avós do Espaço Cultural Vértice (http://verticeespacocultural.com.br/), em São Paulo. São reuniões mensais, que reúnem avôs e avós para conversar sobre angústias, experiências e anseios, sob a coordenação da psicopedagoga e orientadora familiar Christiane Mermerian.

A iniciativa foi criada no ano passado – e, nesse tempo, houve sessões que chegaram a reunir 50 pessoas. “O intuito foi trazer o valor da família de volta, incentivá-los e orientá-los para essa nova criançada que vem por aí”, explica Christiane, acrescentando que cada encontro tem um tema, mas que deixa espaço para alterações, e assim atender às demandas dos avós.

“Os avós estão perdidos”

“Os avós estão perdidos”, afirma a psicopedagoga. E há alguns motivos para isso. O primeiro é uma espécie de afastamento em família: as crianças têm muitas atividades, os pais estão com agendas apertadas demais para levá-las até a casa de seus pais e os celulares têm roubado boa parte do tempo de convivência.

Para os avós, esse distanciamento é ruim – porque o contar histórias e o afeto fazem bem durante toda a vida e especialmente durante o envelhecimento. Para as crianças, também não é bom. Elas ficam sem conhecer a história da família e há uma espécie de desenraizamento, que pode levar à falta de empatia e ao individualismo, explica Christiane. E os mais velhos, “de uma forma muito afetiva e lúdica, podem mudar isso”.

Outro motivo é o novo perfil das pessoas que passaram dos 50 ou 60 anos de idade. Antigamente, eram aposentados e muitos viviam para cuidar da casa e dos netos. Hoje, boa parte está no mercado de trabalho e outro tanto tem uma agenda de compromissos e atividades fora do lar.

A psicopedagoga destaca que investir na vida pessoal, além de ser salutar, não é impeditivo para estar com os netos. Mesmo assim, assinala Christiane, há quem se sinta culpado por não estar à disposição da família todo o tempo. Mas ressalta: “O tempo que eles têm de companhia deve ter muita qualidade”.

Nos encontros, que têm duração de duas horas, os avós contam histórias, partilham seus sucessos e levam suas dúvidas. “Muitos avós precisam ser ouvidos: há os moderninhos, mas há também os muito solitários.” E, em grupo, “um dá força para o outro”.

A aposentada Hisae Okawara Zoriki, 75 anos, participou de uma reunião no segundo semestre que tratou de temas como “padrões de comportamento dos adolescentes e problemas que decorrem de balada, bebidas e drogas”. Avó de duas meninas – uma de 10 e outra de 14 anos –, foi a convite da filha.

“Hoje, o mundo é mais complexo. Nós, avós, temos necessidade de participar de grupos de discussão”, pondera ela, para não “ficar defasados”. Como tudo “muda muito rapidamente”, sinaliza Hisae, “é importante que a gente consiga ser uma interlocutora mais eficiente para que seja ouvida pelos netos”.

As crianças são “mais vivas”, estão com agendas cheias e têm muitos apelos – como internet – que as de antigamente, avalia a aposentada. O que torna encontros com netos, por exemplo, menos frequentes. Ainda que o tempo junto esteja mais escasso, diz ela, “é importante que a gente resgate a história da família porque as crianças precisam conhecer suas raízes. E não tem ninguém melhor do que os avós para isso”.

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