Para mim, os Estados Unidos sempre foram uma terra de possibilidades ilimitadas. Também é o lugar em que meus netos estão crescendo. Graças ao Skype (criado na União Europeia!), posso fazer parte da vida deles sempre que quiser. Claro, digo isso porque sou uma avó orgulhosa, mas também porque pode nos ajudar a focar a essência do envelhecimento.

O envelhecimento consiste em manter a qualidade de vida, a saúde, a independência e uma vida ativa sem exclusão social. O grande desafio é organizar nossa economia e nossa sociedade de forma a tornar isso realidade para grande parte da população, que está envelhecendo. Essa não é uma tarefa fácil.

Você poderia olhar para a nossa sociedade em envelhecimento como um triunfo. O avanço da medicina e das políticas públicas vem entregando algo maravilhoso aos nossos cidadãos: vidas mais longas e saudáveis. Mesmo assim, muitas pessoas enxergam o envelhecimento como um desafio, contribuindo para o aumento das contas públicas e demandando respostas árduas.

Também se pode ver isso como uma oportunidade fantástica, permitindo que as pessoas contribuam para a nossa sociedade após os 65 anos de idade. A “economia grisalha” europeia já representa 3 trilhões de euros e cresce rapidamente. Não importa de que forma você olhe isso, uma coisa é clara: a mudança é enorme e devemos reagir.

“Em 2060, o mundo será inteiramente diferente demograficamente, e isso exige mais do que alguns ajustes nas regras de aposentadoria”

No meu papel de comissária europeia para a Agenda Digital, tentei fazer com que as pessoas vissem as possibilidades ilimitadas de envelhecimento demográfico e convencê-las a mudar a política, as políticas públicas e a filosofia. Em 2060, o mundo será inteiramente diferente demograficamente, e isso exige mais do que alguns ajustes nas regras de aposentadoria.

A inovação é para todos

Precisamos de inovação, mas em um sentido amplo – incluindo a tecnológica, social e econômica. Mas como estimulamos e apoiamos isso? Essa é uma pergunta complicada. Uma parte importante da resposta está na tecnologia digital ou, mais especificamente, em produtos e serviços aprimorados por TIC (Tecnologia da Informação e da Comunicação) para o envelhecer bem. Estou convencida de que eles podem nos ajudar a alcançar maior qualidade de vida, sistema de saúde e de cuidados mais sustentável e crescimento econômico e novos empregos – uma vitória tripla.

Muitas pessoas acreditam que a tecnologia não deva ultrapassar os cuidados. Dizem que cuidar e curar é o trabalho de pessoas ou que os mais velhos e as novas tecnologias não combinam muito bem. A inovação das TIC está, por princípio, associada a jovens: adolescentes enviando mensagens constantemente, sites legais voltados para pessoas de vinte e poucos anos e milionários criadores de start-ups que mal saíram do ensino médio.

“A tecnologia inovadora é para todos – e isso pode apoiar nossa mudança para uma sociedade mais amiga da idade”

Mas isso está descaradamente errado. Se bem concebido e respondendo às necessidades de usuários reais, a tecnologia inovadora é para todos – e isso pode apoiar nossa mudança para uma sociedade mais amiga da idade.

A saúde e os cuidados podem ser usados como exemplo. Nossas instituições de cuidados foram construídas em uma era diferente: destinada a lidar com condições agudas e problemas de curto prazo, e baseadas em idas ao médico, internações hospitalares e prescrições de medicamentos. O envelhecimento da população enfrenta outros desafios: problemas crônicos, degenerativos e de longo prazo estão se tornando cada vez mais frequentes.

Isso exige um tipo diferente de solução, que não roube a dignidade e a independência das pessoas, mas que as coloque no centro da provisão de cuidados. Requer uma abordagem que não se concentre no tratamento, mas na prevenção e na detecção precoce no apoio a estilos de vida ativos e saudáveis. As TIC fornecem muitas ideias para essa abordagem – desde aplicativos móveis simples que capacitam as pessoas a assumir o controle e monitorar sua saúde até ambientes inteiros para a vida assistida sem depender dos outros.

“O envelhecimento não conhece fronteiras”

Aprecie as diferenças

O envelhecimento não conhece fronteiras. A União Europeia, os Estados Unidos e muitos outros países compartilham esse desafio. Na Europa, os governos ainda são amplamente responsáveis por oferecer cuidados a quem precisa. Eles podem ser eficazes agentes de mudança, mas, às vezes, o mercado é mais receptivo. E há a fragmentação europeia ao longo das fronteiras nacionais, que trabalhamos muito para superar.

É provavelmente por isso que estamos atrasados na aplicação do potencial da inovação, especialmente em áreas como saúde e cuidados, que são dominadas pela regulamentação nacional e pela intervenção governamental. Mas nossa diversidade pode ajudar a conceber soluções adaptáveis, aplicáveis e transferíveis para diferentes configurações: soluções flexíveis e abertas para um mercado global.

A AARP nos mostra algo que a Europa não tem: uma organização de advocacy para toda a população, com poder de compra para ajudar a moldar o crescente mercado grisalho. Mas a Europa também tem muito a oferecer às empresas americanas. As políticas governamentais ativas sobre envelhecimento, pesquisa e inovação certamente estão em jogo aqui; o Intel Technology Research for Independent Living Center, na Irlanda, é um bom exemplo.

Muitas iniciativas da Comissão Europeia apoiam a inovação para o envelhecimento saudável. Elas consideram as dimensões específicas mencionadas acima, mas sempre visam a soluções com potencial internacional. Primeiro, existem os principais programas plurianuais de investigação e inovação: o Sétimo Programa-Quadro (FP7) e o novo Horizonte 2020 (H2020), que se estendem de 2014 a 2020.

“Queremos ajudar a traduzir interessantes ideias de pesquisa em produtos e serviços com um claro potencial de mercado”

Promover uma vida mais longa e saudável é um dos desafios sociais do programa H2020, de 7 bilhões de euros. Lá, continuaremos a financiar pesquisas fundamentais sobre o efeito do envelhecimento no corpo, na mente e na comunidade, bem como tecnologias, serviços e aplicações que podem enfrentar esses desafios e apoiar o envelhecimento ativo. Também financiaremos ações de inovação em larga escala para demonstrar como certas soluções geram retorno sobre o investimento em termos de qualidade de vida, ganhos de eficiência em cuidados e crescimento econômico. Esperamos continuar com a colaboração com as empresas e instituições dos EUA no âmbito do H2020, em especial sobre plataformas abertas e padrões de interoperabilidade como base para uma abordagem aberta e de grandes dados para a inovação em cuidados.

Tecnologia assistiva para a vida independente

Sob o H2020, também financiaremos o Programa Conjunto de Vida Assistida Ambiental (AAL JP), voltada para os Estados-membros. Com este programa, queremos ajudar a traduzir interessantes ideias de pesquisa em produtos e serviços com um claro potencial de mercado. Depois de uma primeira versão bem-sucedida, planejamos lançar uma segunda rodada para os próximos sete anos. Em cada projeto AAL, trabalham em conjunto pelo menos três Estados-membros, uma pequena ou média empresa, uma instituição acadêmica e uma organização de usuários.

Parte do sucesso se deve à participação de pequenas e médias empresas inovadoras, que desenvolvem soluções baseadas em TIC – por exemplo, para manter pessoas mais velhas socialmente interativas, aumentar sua mobilidade ou ajudá-las a gerenciar as atividades diárias em casa. Para aprimorar e apoiar a elaboração de políticas públicas baseadas em conhecimento, nós conduzimos a iniciativa conjunta “Mais Anos, Vidas Melhores”.

“A inovação só é valiosa se fizer diferença concreta na vida das pessoas”

Finalmente, a inovação para a vida saudável e o envelhecimento ativo é um dos temas prioritários das Comunidades de Conhecimento e Inovação do Instituto Europeu de Tecnologia. Isso tudo já é muito, mas não é suficiente. A inovação só é valiosa se fizer diferença concreta na vida das pessoas. Só então as pessoas verão os benefícios.

Produzindo faíscas para fazer fogo

Dois anos atrás, decidimos que seria necessário dar um passo além para assegurar que o que funciona em nível local seja compartilhado e ganhe escala internacionalmente. Para conseguir isso, precisamos criar um ambiente mais favorável a inovações com um histórico comprovado e definir quais políticas públicas precisamos adotar para fazer isso acontecer – sejam políticas sociais e de saúde, sejam econômicas e de emprego.

É tempo de remover as barreiras, incluindo regulação e arranjos institucionais que bloqueiam a implantação de boas práticas que já estão disponíveis. Essa é a filosofia de nossa Parceria Europeia de Inovação para o Envelhecimento Ativo e Saudável (EIP- AHA). Mais de 3.000 envolvidos (empresas, pacientes, associações profissionais e acadêmicos) comprometeram-se a unir forças em seis ações concretas: aderência à medicação, prevenção de queda, fragilidade e desnutrição, cuidados integrados, vida independente e ambientes amigáveis à idade. Experiências têm mostrado que a telesaúde pode ajudar a melhorar a sobrevivência e a recuperação, assim como cortar visitas hospitalares onerosas e inconvenientes.

“Em alguns lugares com serviços de telemonitoramento, os custos médicos foram consideravelmente reduzidos”

Em alguns lugares com serviços de telemonitoramento, os custos médicos foram consideravelmente reduzidos, enquanto em outros houve aumento na qualidade de vida de pacientes crônicos. Há até regiões em que novos empregos têm sido criados. Em outras palavras, as fagulhas estão lá, mas nós não precisamos acender o fogo. É por isso que os participantes do EIP-AHA reúnem, dividem e compartilham evidências uns com os outros, fazem intercâmbio de boas práticas, energizam aqueles que recebem a mensagem e educam aqueles que não a têm. Essas muitas iniciativas já estão ajudando a melhorar a vida de milhões de europeus em um sentido prático.

Criar uma União Europeia amiga da idade é também sobre construir cidades mais inteligentes e “age-friendly”, onde é fácil circular, com casas e prédios que são mais sensíveis às necessidades das pessoas.

“Envelhecer não é um problema – é o oposto disso”

Esse é o tema de mais uma parceria europeia de inovação. E, é claro, precisamos de uma banda larga onipresente e rápida para tornar tudo isso possível. É por isso que, recentemente, apresentei a proposta de um mercado único para as telecomunicações.

Envelhecer não é um problema – é o oposto disso. Isso pode ser uma fonte de inovação e crescimento. Não é um custo crescente para ser cortado, mas uma oportunidade crescente de mercado para ser servido. Todos nós deveríamos nos beneficiar com isso. Vamos unir forças para tornar esse desafio global em uma fonte de inspiração e crescimento para todos.

Sobre a autora

Neelie Kroes foi ministra na Holanda, trabalhou no conselho de diversas companhias e se tornou presidente da Nyenrode University. Em 2004, tornou-se comissária de concorrência da União Europeia e, em 2010, vice-presidente da comissão responsável pela agenda digital.

Artigo original: http://journal.aarpinternational.org/a/b/2014/03/a-digital-agenda

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