Atingir a maturidade com qualidade de vida e muito charme. Eis o objetivo do Projeto 60 anos, criado por Claudia Grande. Ela, que se define como uma pessoa “grande” no tamanho e nos sonhos, tem 66 anos e está cheia de metas, desafios e aventuras. Para muitas delas, aliás, leva uma legião de seguidoras junto. Todas querem participar das viagens e encontros organizados por Cláudia. Algumas levam filhos e até marido. Para se ter ideia, a página do Projeto no Facebook tem cerca de 850 mil pessoas compartilhando pensamentos e atitudes relacionados à longevidade. E no instagram são mais de 100 mil.

Cláudia acredita que envelhecer "não é para os fracos", mas pensa que é possível se preparar para que o processo seja mais simples e feliz. 

Se prepare, tenha orgulho da sua história, conte com orgulho a sua idade. Deixe escrito pros seus netos. Quando você tem olhos que brilham e sorriso no rosto, ninguém olha suas rugas. E se tiver rugas, tudo bem, pois são suas histórias.”

Confira a entrevista!

Cláudia Grande, criadora do Projeto 60 anos
Foto: divulgação

Cláudia, conte um pouco da sua vida para os leitores. Onde nasceu, cresceu?

Nasci em Campo Grande, Mato Grosso. E sou grande mesmo. De tamanho, de altura, de largura, de sonho, de projeto (risos). Mudei para São Paulo com 10 anos, tenho quatro irmãos. Sempre trabalhei com empresa ambiental e de construção. E também tinha aterro sanitário.

Um dia, depois do meu divorcio e tendo enfrentado o câncer três vezes, resolvi dar uma guinada na minha vida. Vi uma roupa no Face, um smoking sem manga, e resolvi usar na minha festa de 60 anos. Estava muito gorda e não ia caber. Eu resolvi, então, fazer uma página chamada Projeto 60 anos, cujo objetivo inicial era contar o meu processo de emagrecimento, dizer que eu ia correr na rua, etc.

Tinha convidado 100 pessoas para o meu aniversário, mas uma semana depois, 1.000 entraram perguntando sobre o tal smoking. Eu também tinha citado na página as viagens que eu queria fazer e apareceram pessoas querendo ir junto. 

Para ter ideia, no primeiro mês, levei 30 pessoas para viajar comigo num cruzeiro pela América do Sul.  Quando voltei, já estavam perguntando qual seria a próxima. E não era o meu negócio!

Você ficou espantada com esse sucesso todo? O que você acha que as pessoas estavam procurando e encontraram na página do Projeto 60 anos?

Eu senti que estavam faltando coisas para essa faixa etária. Comecei a procurar na época porque não tinha me dado conta de que estava fazendo 60 anos. E acho que, através do Projeto 60 anos, fui uma das primeiras a falar em moda, saúde e viagens para essa faixa. Todo mundo fala que o Facebook é uma mídia velha, e sou velha (risos). As outras são mais superficiais, rápidas. No Face dá para dialogar com essas mulheres. Entram umas 200 pessoas por dia lá!

Você fala muito sobre a importância das relações, de se ter amigos, conhecer pessoas, resgatar amizades quando se envelhece. Como percebe a importância desse grupo enorme que criou para outras mulheres? 

Antes do Projeto 60 anos eu não pensava assim, mas passei a ver que a gente se torna invisível a partir de uma certa idade. Agora estamos começando a virar moda porque as empresas descobriram que é um nicho muito bom, mas não tinha nada para a gente. Coincidentemente, veio a pandemia e ela fez com que as redes estourassem. A gente ficou muito sozinha e essa pandemia fez com que a página fosse muito visitada. 

Tenho um grupo à parte que tem quase 50 mil pessoas para ter ideia. Vira uma grande comunidade, uma grande terapia e é muito importante isso. 

Também tem a questão das viagens organizadas para o grupo. Elas ficaram dois anos paradas e voltamos ano passado. Começamos a fazer encontros também. Fizemos o "Coroas Vivas" após o coronavírus. Eram 150 mulheres, todas vacinadas, e foi incrível.

Tem um vídeo em que você fala que há vida após o divorcio. Há muitas mulheres que encontram consolo no grupo quando se separam?

Quando alguém que acabou de se divorciar vem falar comigo eu pergunto: Quem era você antes do casamento? Você existia? Se existia, resgate essa mulher. Essa mulher que interrompeu algum sonho quando casou e teve filhos, por exemplo. As pessoas se esquecem de quem eram. Onde estão suas amigas, primas, irmãs? Tem vários grupos de mulheres divorciadas, viúvas, que descobriram que existe vida após o divórcio. 

Voe, se arrume, fique bonita, faça cursos. Tem muitas ONGs, clubes em que você pode se inserir. Quando falo isso para as mulheres, elas vão achando desculpas, mas não deixo a peteca cair. 

Eu, por exemplo, me divorciei após 33 anos de casamento. A primeira viagem que fiz foi sozinha para a África do Sul. Sentei em um restaurante lá e o garçom veio perguntar se eu estava esperando alguém. Falei que não, que eu era livre. Eu sempre queria ir e meu ex marido não queria. Aí montamos esse grupo de viagem e as mulheres se encontram de novo, de 3 em 3 meses. Nos chamamos de “marida” (risos). São sempre quartos duplos e quase sempre arrumam uma melhor amiga na viagem. O objetivo maior do Projeto 60 anos é fazer e manter amizades.

Cláudia, você acha que tem muita diferença quando falamos em envelhecimento para homem e mulher? 

Claro que tem, existe muito mais cobrança para a mulher. Mas as cobranças também são das próprias mulheres, especialmente com relação à aparência. Os homens não sabem ficar sozinhos e logo arrumam outra pessoa. As mulheres nem sempre querem e muitas estão desestimuladas, cansadas. 

No instituto focamos na Longevidade Financeira. Ou seja, na importância de se planejar financeiramente, de cuidar bem do próprio dinheiro para que as pessoas possam viver mais e em equilíbrio financeiro. Como você enxerga essa parte?

Sempre que alguém fala que precisa de dinheiro ou até que não pode se separar porque não tem dinheiro, eu pergunto: O que você sabe fazer de bom? Sabe fazer um bolo, um artesanato diferente? É importante reconhecer em quê você é boa para poder oferecer. Se você faz um nhoque maravilhoso, fale para suas amigas: “Eu faço um nhoque maravilhoso. Não quer servir para sua família neste fim de semana?” 

As mulheres sabem fazer tanta coisa! Não dá para contar muito com emprego na nossa faixa etária, mas é possível usar as redes sociais, os grupos no whatsapp para oferecer as coisas. Não dá para ter vergonha. É preciso se autoconhecer para saber o que tem de melhor e pode ser oferecido. Sempre tem algo!

Outro ponto importante é conservar as coisas que conquistou na vida, os bens. Muita gente sai distribuindo tudo. Por que você vai dar suas coisas antes para os filhos, por exemplo, para depois passar por situações que podem te deixar doente? Acho que a gente deve ajudar os filhos se estiverem em dificuldade, não apenas porque querem comprar um carro melhor ou viajar. Não repasse tudo para todo mundo até ficar sem nada. Ajude no que puder, mas se vender, não distribua. Pense um pouco mais em você. Ah, e procure também falar com pessoas que têm uma renda boa, que sabem como cuidar do dinheiro e faça o mesmo. Procure exemplos e converse com especialistas. É muito importante saber cuidar do próprio dinheiro.

Você lançou o livro Velhezas, que traz muitas crônicas retratando a velhice com  leveza e beleza. Como foi esse projeto?

Uma vez eu assisti as pontes de Madison e esse filme me marcou. Me marcou o fato de os filhos só conhecerem a personagem através do diário que ela deixou depois de morrer. Eu pensava: será que meus filhos e netos vão me conhecer? E cada vez que eu lembrava de uma passagem da minha vida, eu escrevia num papelzinho e colocava numa caixa. E quando o Projeto 60 anos começou, eu comecei a fazer crônicas e elas começaram a fazer sucesso. Então, uma editora portuguesa perguntou se poderia colocar minhas crónicas num livro e publicar. 

Para mim, foi muito bom saber que eu ia repassar minhas experiências. E falo para as mulheres escreverem sobre a vida delas também. 

A gente não conhece nossas avós, bisavós. Tem gente que não sabe nem o nome. É uma forma de honrar os antepassados e deixar os netos nos honrarem. Temos tempo e possibilidades de fazer isso hoje, nem que seja num papelzinho. Depois vai numa gráfica, encaderna e da para a família.

Além do Projeto 60 anos, o que vem pela frente para a Cláudia?

Conheço 42 países e quero continuar conhecendo. Eu não conheço a Jordânia, por exemplo, vou conhecer. E vou levar as mulheres através do Projeto 60 anos. Nesse ano, o foco é no Brasil porque temos mais noção do que acontece por causa da pandemia. Estou voltando a fazer réveillon também. Os homens também podem ir, mas quem quer ir mesmo é mulher. E agora estou me metendo numa coisa interessante, vai ser uma reviravolta na minha vida, sou pré-candidata a deputada federal. Acho que isso vai ser um desafio. Quando a mulher tem um plano, um sonho, o olho brilha. Você só envelhece quando para de sonhar, de fazer planos. 

Quer dizer algo para quem ainda está aprendendo não a lidar melhor com a passagem do tempo?

Quando você tem olhos que brilham e sorriso no rosto, ninguém olha suas rugas. E se tiver rugas, são suas histórias. Cada ruga é uma história. Se você tirar tudo, tira sua história. Existe beleza em todas as idades. É só se cuidar, se arrumar. Tem gente que desiste.

Eu tenho uma frase que é: envelhecer não é para fracos. Porque é tão difícil envelhecer, ter amor, abraços, companhia, dinheiro. Você precisa ser forte. Se você está com seus 50 anos, dá tempo de se preparar para essa invisibilidade que vem depois. 

Se prepare, tenha orgulho da sua história, conte com orgulho a sua idade. Deixe escrito para os seus netos. Tenha planos, sonhos, amigos, viagens, não fique apenas sentado na frente da TV. Hoje falo com mulheres porque acho que o homem tem uma estrutura psicológica há muitos anos que o segura. E eu nem acho que sou idosa, eu vou ser idosa com 90 anos apenas. Eu sou madura. E quem disse que fruta madura não é boa? (risos)