“As cidades brasileiras têm um longo caminho a percorrer com vistas à garantia da qualidade de vida da população, especialmente a idosa, que cresce a cada ano no nosso país a velocidades acima da média mundial”, diz Wesley Mendes-Da-Silva, 43 anos, coordenador acadêmico, na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/EAESP), da equipe desenvolvedora do Índice de Desenvolvimento Urbano para Longevidade (IDL).

Num trabalho de 9 meses para o Instituto de Longevidade Mongeral Aegon, que envolveu 10 pesquisadores e colaboradores no Brasil e no exterior, o IDL traz um ranking inédito das melhores cidades para envelhecer. E inova de três maneiras: considera mais de 60 indicadores relacionados à qualidade de vida em 498 municípios; segmenta em dois blocos, grandes e pequenas, com foco em duas faixas etárias (60-75 e +75); e permite pesquisas e comparações em site próprio. Clique aqui para acessar.

Na avaliação do professor de finanças, práticas modernas de gestão apontam que não somente é possível, como é necessário, que desenvolvimento econômico esteja associado a elevados padrões de vida. “Assim, cidades de melhor qualidade de vida são naturais polos de atração de investimentos, os quais colaboram para a elevação da qualidade de vida”, exemplifica. Para tanto, acrescenta, é essencial a qualidade da governança pública e da privada, assim como o ativismo da população.

O IDL, acrescenta Mendes-Da-Silva, pode ser bastante útil ao gestor público na medida em que oferece uma estrutura integrada de avaliação de impactos de suas decisões na qualidade de vida da população. “Além disso, permite que alguma competição saudável possa ser explicitada periodicamente por meio da classificação de cidades pelo índice”, que, segundo ele, será aprimorado a cada edição.

Leia sua entrevista para o Instituto de Longevidade Mongeral Aegon.

Por que criar o IDL?

Meus interesses de pesquisa nos últimos anos têm sido dirigidos basicamente a promoção da resiliência da sociedade (que as pessoas possam ser mais resistentes a riscos que emergem na vida moderna, tal como o de perda do padrão de vida) e decisões sob condições de ignorância (aquelas que tomamos sem necessariamente processarmos, sem que estejamos suficientemente munidos de informações relevantes).

Assim, a simples escolha de um lugar para almoçar oferece riscos que nem sequer consideramos, tampouco temos condições de aquilatar, por pura falta de informações ou capacidade de processá-las. A partir disso, com a intenção de oferecer informação de qualidade a respeito da vida nas cidades _ para cidadãos, gestores públicos e empresários_, pensamos no IDL.

Qual é a maior inovação do IDL? No que ele se diferencia dos rankings já existentes de melhores cidades para se viver?

Índices de qualidade de vida nas cidades ao redor do mundo já não são necessariamente uma novidade. Existem basicamente duas classes de índices no mundo: os que usam dados objetivos e aqueles que usam dados subjetivos (opinião das pessoas). Cada um possui vantagens e desvantagens.

O IDL inova de três maneiras diferentes. Primeiro, oferece uma estrutura que considera mais de 60 indicadores (selecionados mediante a consideração da literatura científica desse campo de conhecimento) relacionados à qualidade de vida em quase 500 cidades. Segundo, concentra-se nas cidades brasileiras, segmentando-as em dois blocos: grandes e pequenas, com foco em duas faixas etárias distintas de adultos mais velhos. Terceiro, além de oferecer um relatório detalhado do racional, que permite a classificação das cidades, permite que os interessados em pesquisar de informa individualizada cada uma delas possa fazê-lo por meio do site.

Cliqueaquie veja a classificação da sua cidade

Com isso, o IDL pode ser útil a gestores públicos, cidadãos e empresários interessados em oportunidades de negócio dirigidas a satisfazer demandas da sociedade.

Como o IDL identifica ambientes de vida mais amigáveis aos idosos?

O IDL classifica as cidades mediante uma estrutura formada por mais de 60 indicadores, os quais estão organizados em sete grupos de temas relevantes para os idosos. Cada indicador possui um peso na formação do índice. Dessa forma, é possível avaliar como uma determinada ação do governo (como a contratação de médicos ou professores) ou de empresários (como a construção de um condomínio dedicado a idosos) pode impactar a qualidade de vida em uma determinada cidade, seja grande, seja pequena, e considerando-se as necessidades de idosos mais jovens ou mais velhos.

cidades brasileiras não estão preparadas para idosos

É importante destacar que o IDL não tem caráter estático. A cada edição espera-se que haja ajustes e adaptações na lista de indicadores e na sua relevância para a qualidade de vida dos idosos nas cidades. Com isso, provavelmente, a ordem de classificação das cidades será distinta das edições anteriores.

Além de métricas para a formação de indicadores, a população foi ouvida?

Conforme nós conseguimos chegar a uma lista classificatória das cidades, julgamos importante dirigir uma consulta ao público de idosos em algumas cidades que ocuparam as primeiras posições no IDL 2017. Assim, foram ouvidas as pessoas após termos desenvolvido o índice. Contudo, na fase de desenvolvimento, foram realizadas reuniões com prefeitos e seus secretariados e pesquisadores de temas relevantes para o entendimento dos determinantes da qualidade de vida nas cidades.

Por que separar em cidades pequenas e grandes?

Sem dúvida, existem pessoas que preferem viver em cidades mais pacatas e outras em cidades que oferecem uma vida mais intensa. Por isso, entendemos que seria importante permitir que o IDL fosse capaz de refletir preferências por cidades mediante seu tamanho.

Santos e São João da Boa Vista se destacam, respectivamente, entre 498 cidades grandes e pequenas avaliadas e são as mais bem preparadas na promoção de envelhecimento saudável e produtivo. Por quê?  

A classificação delas nesta edição sugere que, com relação às demais cidades grandes (no caso de Santos) e pequenas (no caso de São João da Boa Vista), essas duas apresentaram indicadores melhores, o que certamente é decorrente de administrações públicas e iniciativas privadas. Assim, certamente, existem lições que essas cidades podem ensinar às cidades de desempenho mais modesto.

cidades brasileiras não estão preparadas para idosos Wesley Mendes-Da-Silva, professor de Finanças da FGV/EAESP e coordenador acadêmico da equipe desenvolvedora do IDL; crédito: Brigham Young University

Empresas de alta performance já adotam práticas de selecionar cidades destino de investimento a partir da qualidade de vida típica oferecida aos cidadãos e aos seus funcionários

O que faz de uma cidade um ótimo lugar para envelhecer?

Objetivamente, uma cidade que melhor atende a necessidades e preferências dos idosos, implicando em classificação superior no IDL.

Nesta primeira edição, das cidades mais preparadas, 3 entre as 4 maiores são litorâneas (Santos, Florianópolis e Niterói). Com o sr. avalia?

O fato de ser litorânea não garante boa qualidade de vida, mesmo que, naturalmente, ofereça oportunidades de atividades ao ar livre e maior vocação para determinadas atividades sociais que podem ser contributivas. A exemplo disso, o Nordeste do Brasil possui diversas cidades que não figuram entre as de melhor classificação. Por outro lado, diversas cidades que não estão no litoral obtiveram bom desempenho, com algumas do interior paulista.

As cidades interioranas do Estado de São Paulo dominam os rankings das 20 maiores mais preparadas, com 9 (mais Santo André) ranqueadas, e das 40 menores, com 26. Quais características favoreceram as boas colocações desses municípios no estudo?

Oportunidades de crescimento profissional e intelectual, assistência de saúde, menor desigualdade social e menores níveis de violência são exemplos de indicadores que colaboraram para a boa classificação das cidades dessa região no IDL 2017.

Bem-estar e competitividade têm sido vistos como dois lados de uma moeda, quando o assunto são cidades sustentáveis. Há uma pesquisa da Cardiff University, inclusive, que faz uma significativa associação entre a competitividade das cidades e o nível típico de bem-estar oferecido localmente. Como resolver esse paradigma? É possível desenvolvimento econômico integrado a coesão social, bem-estar e políticas ambientais?

Sem dúvida, práticas modernas de gestão apontam que não somente é possível, como é absolutamente necessário, que desenvolvimento econômico esteja associado a elevados padrões de vida. Empresas de alta performance já adotam práticas de selecionar cidades destino de investimento a partir da qualidade de vida típica oferecida aos cidadãos e aos seus funcionários.

Assim, cidades de melhor qualidade de vida são naturais polos de atração de investimentos, os quais colaboram para a elevação da qualidade de vida. Para tanto, é essencial a qualidade da governança, seja na esfera pública (prefeito, especialmente) ou na privada. Conforme o acesso à informação seja maior, o ativismo da população exerce papel-chave no exercício do controle dos impactos das decisões dos gestores sobre a vida das pessoas.

O IDL pode ser bastante útil ao gestor público na medida em que oferece uma estrutura integrada de avaliação de impactos de suas decisões na qualidade de vida da população

Como os gestores podem usar essa ferramenta de avaliação?

Todo e qualquer gestor deve trabalhar com foco em objetivos e tomar decisões razoáveis que sejam explicitamente dirigidas a tais objetivos. Assim, espera-se que o gestor público tenha como objetivo a promoção do bem-estar da sociedade, respeitando as restrições às quais estão submetidos, especialmente de limites de orçamento.

O IDL pode ser bastante útil ao gestor público na medida em que oferece uma estrutura integrada de avaliação de impactos de suas decisões na qualidade de vida da população. Além disso, permite que alguma competição saudável possa ser explicitada periodicamente por meio da classificação de cidades pelo índice.

De maneira similar, os gestores das empresas privadas podem utilizar-se do IDL para delinear as políticas públicas de empresas privadas, ou seja, planejar e identificar precisamente o impacto social de suas decisões na esfera da empresa. E ainda os gestores de empresas podem identificar oportunidades de negócio com base em necessidades da sociedade que estejam sendo atendidas.

De forma geral, o sr. conclui que as cidades brasileiras estão preparadas para os idosos?

Sabemos que as nossas cidades possuem um longo caminho a percorrer, com vistas à garantia da qualidade de vida da população, especialmente a idosa, que cresce a cada ano no nosso país a velocidades acima da média mundial.

Em adição, existem assimetrias claras entre as cidades brasileiras, dadas as dimensões continentais do Brasil. Isso sugere a necessidades de políticas públicas diferentes para regiões diferentes. Sem dúvida, há muito trabalho a fazer!

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